O Pico do Itabira e a confusão de leis facilitando o Desmatamento e a Especulação Imobiliária

Uma análise territorial, cartográfica e documental para proteger esta importante Unidade de Conservação tombada pelo Conselho Estadual de Cultura (CEC).

O Pico do Itabira (ou Pedra do Itabira) é uma formação rochosa que chega a 715 metros de altitude, localizada no município de Cachoeiro de Itapemirim, no sul do Espírito Santo, cujas formas lembram um dedo indicador apontando para o céu.

Etimologicamente, seu nome deriva do tupi-guarani e significa “pedra pontuda” (itá = pedra; apira = ponta; segundo o Dicionário Ilustrado Tupi-Guarani), sendo também denominada “pedra empinada” ou “pedra brilhante” segundo outras fontes.

Filmagens com drone do Pico do Itabira, feitas pelo Arquiteto e Urbanista Thiago Barreto, em 2019.
(Fonte: https://www.jornalfato.com.br/cidades/arquiteto-faz-imagens-exclusivas-do-pico-do-itabira-e-impressiona,301229.jhtml)

Geologicamente, o pico se insere no Complexo Paraíba do Sul, de idade proterozóica, sendo composto por granitos, gnaisses e mármores, e se encontra numa região de extraordinária beleza natural, com córregos, florestas, lagoas, cachoeiras e trilhas, que atraem visitantes e adeptos de esportes como mountain bike, trekking, escaladas e alpinismo.

Croqui de rotas de Escaladas e Alpinismo publicado pela Associação Capixaba de Escalada – ACE, em 2011.
(Fonte: http://www.adventurezone.com.br/blog/a-associacao-capixaba-de-escalada-%E2%80%93-ace-promove-dois-grandes-eventos-esportivos-no-mes-de-agosto)

A motivação para publicar esta matéria vem da necessidade de fornecer subsídios legais e cartográficos para os Movimentos Socioambientais, Ministério Público, e demais guerreiros(as) defensores do meio ambiente e da paisagem (patrimônio cultural) de Cachoeiro de Itapemirim, contra as constantes e recorrentes ofensivas da Especulação Imobiliária e do grande capital que tentam se apropriar até dos resquícios de paraísos ecológicos tão belos e importantes como este.

Para se ter ideia da pressão sofrida por nossos patrimônios naturais, em 2014, o próprio Conselho do PDM de Cachoeiro de Itapemirim – CPDM, solicitou autorização do Conselho Estadual de Cultura (CEC) para inclusão de uma Zona de Ocupação Controlada (ZOC) nas proximidades do Monumento Natural Pico do Itabira.

Ou em outras palavras, queriam liberar uma área gigantesca para Loteamentos de casas e mansões (lotes de 400 a 750m² com construções de até 2 andares) na beirada do monumento natural e dentro de áreas ambientais/paisagísticas protegidas por legislações específicas – mas que graças aos estudos realizados, e com apoio do Ministério Público de Cachoeiro de Itapemirim, conseguimos proteger. Ao menos por enquanto.

Pico do Itabira visto da cidade de Cachoeiro de Itapemirim-ES.
(Fonte: https://viagemturismoaventura.blogspot.com/2017/04/pico-do-itabira-cachoeiro-do-itapemirim.html)

Adiante reproduziremos parte das análises geográficas e mapeamentos realizados quando ocupava o cargo de conselheiro da câmara de patrimônio natural, ecológico e paisagístico do Conselho Estadual de Cultura (CEC), e que foram aprovadas pelo plenário deste.

Finalmente foi organizada a confusão entre as quase 10 legislações municipais de criação e alteração desta Unidade de Conservação (ambiental), que se sobrepunham no espaço, e ainda as legislações estaduais referentes a este Bem Paisagístico Natural (patrimônio cultural) tombado pelo CEC.

Neste trabalho foram mapeadas todas as poligonais destas legislações (já que nelas constam apenas tabelas com coordenadas), para identificar quais seriam atualmente os verdadeiros limites dos dois tipos de proteção legal que incidem sobre a área: proteção ambiental (por parte do município) e tombamento cultural-paisagístico (por parte do estado), que analisaremos a seguir.

O Tombamento do Bem Paisagístico Natural “Pico do Itabira” foi solicitado pela primeira vez ainda em 1984 pelo conselheiro estadual de cultura, Sr. Gabriel Augusto de Mello Bittencourt, junto com o tombamento das paisagens naturais e notáveis do “Frade e a Freira” e das jazidas arqueológicas, pela feição extraordinária com que foram dotadas pela natureza e pelo que representam para as comunidades cachoeirense e espírito-santense.

Apesar do tombamento estadual do Bem Paisagístico Natural “O Frade e a Freira” ter sido aprovado em 1986, o do “Pico do Itabira” (ambos estaduais) foi desconsiderado apenas pelo fato do município já te-lo transformado em Parque Municipal através de legislação específica, o que obviamente não se justifica pois parque municipal (ambiental) é diferente de tombamento de patrimônio cultural, ainda mais que os dois tombamentos eram parte do mesmo processo.

Mesmo após reiteradas deliberações do Plenário do Conselho Estadual de Cultura em 1984 e 1985, todas favoráveis ao tombamento do Pico do Itabira, apenas no ano de 1999 o conselho finalmente o efetuou através da Resolução CEC Nº 005/99, com uma poligonal abrangendo a área de 252,65 hectares, porém não foi definida a Zona de Amortecimento ao redor da poligonal em questão.

Resolução CEC Nº 005/99, que aprova o Tombamento do Bem Paisagístico Pico do Itabira, em 20 de setembro de 1999.
Poligonal de Tombamento do Bem Paisagístico Natural “Pico do Itabira” sobre Ortofotomosaico 2007/2008, produzido e fornecido pelo IEMA.

A resolução de tombamento cultural-paisagístico estadual ainda foi homologada pelo Decreto Estadual Nº 564-R/2001, cujo polígono protegendo uma área de 252,65 hectares nunca sofreu alterações – diferentemente das poligonais municipais de proteção ambiental, e principalmente suas Zonas de Amortecimento que as circundam, que foram modificadas muitas vezes como veremos mais adiante.

O Parque Municipal do Itabira foi criado pela LEI MUNICIPAL Nº 2856/1988, para resguardar os atributos excepcionais da natureza, como o Pico do Itabira, formações geológicas, matas vizinhas e áreas adjacentes; proteger o solo, a fauna, a flora, cursos d’água e demais recursos naturais da região, utilizando-os apenas para objetivos educacionais, científicos, recreativos e turísticos; ou seja, proteger o meio ambiente e assegurar condições para o bem estar público.

Pico do Itabira (Foto: Roberto Martins).

Ficou proibida a alienação e a mutilação total ou parcial da área do Parque, ou qualquer forma de exploração e depredação dos recursos naturais ali existentes, inclusive a caça, pesca ou o uso de fogo nas florestas.

A área do parque foi definida e corrigida pelo Decreto Municipal Nº 6159/1988 como sendo de 104,75 hectares, porém acreditamos ter ocorrido algum erro na produção do texto deste decreto, uma vez que não consideraram as áreas de afloramentos rochosos dentro da poligonal, o que eleva a dimensão da área real para 157,97 hectares, que ficou com o seguinte traçado:

Poligonal do “Parque Municipal do Itabira” (Decreto Nº 6159/88) sobre Ortofotomosaico 2007/2008, produzido e fornecido pelo IEMA.

Note nos dois últimos mapas acima que os polígonos são bem diferentes. O Tombamento (estadual) lembra um pentágono com 252,65 hectares, e o Parque (municipal) um triângulo com 157,97 hectares.

Porém a partir da criação do Parque Municipal em 1988, começa uma verdadeira montanha-russa se acompanharmos a cronologia de leis e decretos alterando desde os limites da área ambiental protegida, até regras de Uso e Ocupação do Solo no território – o que gera uma confusão vertiginosa para gestores públicos, advogados, consultores, juízes de direito, promotores de justiça, e outros cidadãos, já que na maioria destas legislações as poligonais não se encontram mapeadas, constando apenas Memoriais Descritivos com suas listas ou tabelas de coordenadas.

Esta confusão pode beneficiar justamente os interessados em lucrar com a exploração de recursos naturais ou com outras modalidades de uso do solo, sem se importar com a destruição da paisagem e de paraísos ecológicos que garantem a qualidade de vida da população (inclusive na cidade).

A LEI MUNICIPAL Nº 5235/2001 que foi aprovada em seguida é meio confusa, pois cria os Parques Ecológicos do Frade e a da Freira, do Itabira, e outros; autoriza a criação do Parque Municipal do Itabira, mesmo este já tendo sido criado em 1988; e institui Parques Ecológicos, mesmo não existindo esta categoria no Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC (Lei Federal Nº 9.985/2000) já existente à época.

Em seguida, a LEI MUNICIPAL Nº 5484/2003, reconhece o Parque como Área de Preservação e Patrimônio Ambiental do Município.

Já a LEI MUNICIPAL Nº 5774/2005, altera a denominação e a classificação desta unidade de conservação, de Parque Municipal do Itabira para Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Itabira, enquadrando-o em categoria existente no SNUC, de Uso Sustentável, que seria uma área natural onde vivem populações tradicionais que se baseiam em sistemas sustentáveis de exploração de recursos naturais desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições ecológicas locais. Modalidade esta que permite visitação pública e pesquisa científica.

Esta lei revoga aquela outra lei municipal confusa que versava sobre Parque Ecológico, e corrige as dimensões totais da área de proteção desta Unidade de Conservação de 104,75 hectares para 157,97 hectares, ao considerar também os afloramentos rochosos e não apenas a soma das propriedades dentro da poligonal – tanto é que o texto da lei afirma expressamente que manterá o mesmo traçado do Parque Municipal original.

A LEI MUNICIPAL Nº 6177/2008 transforma a Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Itabira em Monumento Natural do Itabira, mantendo a mesma área (157,97 hectares) mas aumentando o rigor das regras de preservação ambiental já que passou a uma categoria do SNUC de Proteção Integral, e não mais de Uso Sustentável.

O que é no mínimo “ESTRANHO“, é que esta mesma lei que aumentou o nível restritivo dos usos do solo permitidos na área, protegendo mais o meio ambiente, tenta facilitar a especulação imobiliária com a liberação de CONDOMÍNIOS HORIZONTAIS DE LOTES até mesmo em ZONAS RURAIS, tentando forçar a transformação destas propriedades em ÁREAS URBANAS.

O que em nosso entendimento (salvo melhor juízo) chega a beirar o ridículo, uma vez que é uma atitude completamente equivocada e ILEGAL, já que o próprio SNUC (LEI FEDERAL Nº 9.985/2000) afirma claramente em seu Artigo 49 que a área de uma unidade de conservação do Grupo de Proteção Integral é considerada zona rural, para os efeitos legais, e que a zona de amortecimento das unidades de conservação de que trata este artigo, uma vez definida formalmente, não pode ser transformada em zona urbana.

Sendo assim, podemos constatar no município algumas alterações legislativas no sentido de se promover mudanças nas regras de Uso e Ocupação do Solo, facilitando a expansão da zona urbana sobre a rural, o uso residencial do solo e a proteção da propriedade privada – apesar das regras impostas pelo SNUC para a categoria de Unidade de Conservação “Monumento Natural”, que faz parte do grupo de Proteção Integral, categoria que deve ser obrigatoriamente em zona rural, e onde se deve efetuar desapropriações de terras em caso de conflitos entre o uso dado a ela pelo proprietário e o objetivo do Monumento Natural, que é de preservar sítios naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica.

Felizmente, a Lei de Condomínios Horizontais (Lei Municipal Nº 6.151/2008), segundo o Sistema de Legislação On-Line do município, foi revogada totalmente por uma Ação de Inconstitucionalidade (Lei Nº 107795/0, que não encontramos o texto no sistema, apenas a indicação do número); e a Lei Municipal Nº 6177/2008 foi revogada pela Lei Municipal Nº 6954/2014, que analisaremos mais adiante para garantir a sequência cronológica desta análise legislativa.

A LEI MUNICIPAL Nº 6260/2009 vem aumentar este imbróglio, gerando ainda mais confusões na área, ao ampliar, redimensionar, e reposicionar o Monumento Natural Pico do Itabira, mas ao menos estabelece especificamente a sua Zona de Amortecimento. Observe como se modificou a geometria da poligonal, que até então lembrava um triângulo e agora se aproxima de um quadrado:

Poligonal do “Monumento Natural do Itabira” (Lei Municipal Nº 6260/2009) sobre Ortofotomosaico 2007/2008, produzido e fornecido pelo IEMA.

Acima visualizamos o novo polígono da área do Monumento Natural Pico do Itabira com 217,30 hectares (corrigida), e abaixo em outra escala, o polígono criado para sua Zona de Amortecimento:

Monumento Natural do Itabira e sua ZONA DE AMORTECIMENTO (Lei Municipal Nº 6260/2009) sobre Ortofotomosaico 2007/2008.

A gigantesca poligonal da Zona de Amortecimento criada para a unidade de conservação é de 1.382,50 hectares (sem a UC interna).

Finalmente, a LEI MUNICIPAL Nº 6954/2014 revoga a Lei Nº 6177/2008 e a Lei Nº 6260/2009, e restabelece o Monumento Natural Pico do Itabira, redefinindo sua Zona de Amortecimento.

Desta forma, a Lei Municipal de 2014 foi adequada às premissas federais relativas à categoria de “Monumento Natural” do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC, 2000), que tem o objetivo de “(…) preservar sítios naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica.”. Diferentemente do que estabelecia a Lei Nº 6177/2008, onde os objetivos impostos divergiam da preservação ambiental e paisagística na medida em que abria precedente para a expansão urbana sobre a rural, o uso residencial do solo em loteamentos de condomínios horizontais (mansões), e de nosso ponto de vista, uma exagerada, ideológica, e sobretudo ilegal, projeção da propriedade privada acima dos direitos ambientais difusos da sociedade brasileira.

Do ponto de vista da Proteção Ambiental e Paisagística, esta Lei de 2014 traz algumas inovações e avanços positivos para o município de Cachoeiro de Itapemirim, já que a área do Monumento Natural do Itabira foi só aumentando e que agora passa a ter a área de 450,18 hectares.

Já a Zona de Amortecimento do Monumento Natural do Itabira passa a ter, segundo esta Lei Municipal Nº 6954/2014, a área de 1.303,79 hectares, mas que se excluirmos a área (interna) da Poligonal do Monumento Natural, a Zona de Amortecimento deste possui a área real de 853,61 hectares no entorno do monumento.

Monumento Natural do Itabira e Zona de Amortecimento (Anexo III da Lei Municipal Nº 6954/2014).

A ÁREA DE ENTORNO do Bem Paisagístico Natural “Pico do Itabira”:

Conforme vimos no início, o processo de tombamento do Bem Paisagístico Natural Pico do Itabira não estabeleceu sua “Zona de Amortecimento” (ou área de entorno) ao redor deste mecanismo legal de proteção ao patrimônio natural e paisagístico estadual.

A referência legal que encontramos para defini-la está presente na RESOLUÇÃO CEC Nº 03/1991, de Tombamento da Mata Atlântica e seus Ecossistemas Associados no Estado do Espírito Santo, que a cria com 01 km de largura no ano de 1991

Na época de composição desta resolução, a única poligonal de proteção paisagística e ecológica legalmente definida para o Pico do Itabira era definida pelo Decreto Municipal Nº 6159/1988, obrigando a utilização deste referencial legal de âmbito MUNICIPAL, para o Tombamento da Área de Entorno ESTADUAL, onde a poligonal seria esta:

Parque Municipal do Itabira (Decreto Nº 6159/1988) e Tombamento da Área de Entorno com 1km de margem (Resolução CEC Nº 03/1991).

Assim sendo, no ano de 1991, eram estas as poligonais vigentes do Parque Municipal do Itabira, com área de 180,63 hectares; e do Tombamento da Área de Entorno do Itabira, em margem de 1km de largura, com uma área de 897,25 hectares.

Ao observarmos com rigor a letra das legislações pertinentes em relação aos Tombamentos de Bens Paisagísticos Naturais na região do Pico do Itabira relativos ao Conselho Estadual de Cultura, ou seja, em âmbito ESTADUAL, as poligonais vigentes seriam estas abaixo:

Bem Paisagístico Natural Pico do Itabira (Resolução CEC Nº 05/1999)
e Área de Entorno Tombada sobre Parque Municipal (Resolução CEC Nº 03/1991).

Podemos perceber que a sobreposição da Área de Entorno do Pico do Itabira (rosa, tombada pela Resolução CEC 03/1991 e delimitada com base no Parque Municipal do Itabira), sobre o tardio tombamento do Bem Paisagístico Natural Pico do Itabira (verde), apresenta alguns problemas de natureza prática – causando uma tremenda insegurança jurídica.

Ocorre sobreposição da poligonal do Bem Tombado (verde) e de sua área de entorno (rosa), onde prevaleceria o rigor do tombamento mais restritivo.

Observemos então como ficaria a delimitação da Área de Entorno Tombado caso consideremos a transformação do “Parque Municipal do Itabira” no “Monumento Natural do Itabira” para sua definição:

Monumento Natural do Itabira (Lei Municipal Nº 6954/2014), Área de Entorno Tombado (Resolução CEC Nº 03/1991) com referência no Monumento Natural, e Bem Paisagístico Natural Pico do Itabira (Resolução CEC Nº 05/1999).

No mapa acima podemos perceber facilmente que as alterações de área e de delimitação sofridas pela poligonal do antigo Parque Municipal, atual Monumento Natural do Itabira (verde/amarelo), tornariam a Área de Entorno do Bem Paisagístico Natural Pico do Itabira (mancha azul) totalmente desconectada do Bem Tombado em si (pontilhado). Principalmente por quilômetros a nordeste (a parte da mancha verde que se estende pra direita, além do pontilhado preto) do Bem Tombado que ficaria sem proteção por parte dos tombamentos estaduais.

Sendo assim, diante de tantas Legislações Municipais e Estaduais sobrepostas no espaço e no tempo, e de suas mútuas interferências, o mais sensato a ser considerado como Área de Entorno do Bem Tombado (Zona de Amortecimento), seria a poligonal expressa pelo mapa abaixo:

Bem Paisagístico Natural Pico do Itabira (Resolução CEC Nº 05/1999) e
adaptação de sua Área de Entorno Tombado (Resolução CEC Nº 03/1991).

Salientamos que este também é o entendimento do IEMA (Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos), uma vez que dentro dos mapeamentos que recebemos por solicitação também consta o mesmo mapeamento desta poligonal de Área de Entorno da figura acima, como podemos ver nas duas figuras abaixo (observem a geometrias os polígonos):

Bem Paisagístico Natural Pico do Itabira (Resolução CEC Nº 05/1999) – IEMA;
e Área de Entorno do Bem Tombado (Resolução CEC Nº 03/1991) – IEMA.

Portanto, os mapas das 03 figuras acima expressam cartograficamente as Poligonais de Tombamento do “Bem Paisagístico Natural Pico do Itabira”, com área de 258,29 hectares; e de sua “Área de Entorno”, com área de 954,38 hectares; ambos tombados pelo Conselho Estadual de Cultura (CEC).

Estando então analisadas e compreendidas as complexas sobreposições de legislações municipais e estaduais de proteção paisagística e natural da região do Itabira em Cachoeiro do Itapemirim, prosseguiremos a seguir com a análise da solicitação inicial do Conselho do Plano Diretor Municipal de Cachoeiro de Itapemirim – CPDM.

Este Conselho do PDM queria autorização do Conselho Estadual de Cultura (CEC) para inclusão de uma Zona de Ocupação Controlada (ZOC) para Loteamentos nas proximidades do Monumento Natural Pico do Itabira, em toda a gigantesca área hachurada (vermelha) do mapa abaixo:

Proposta de Inclusão de Zona de Ocupação Controlada (ZOC) sobre a Zona de Amortecimento do Monumento Natural do Itabira.

Ao sobrepormos os tombamentos paisagísticos de âmbito Estadual sobre esta Unidade de Conservação de âmbito Municipal e sobre a Proposta de criação de uma Zona de Ocupação Controlada (ZOC), percebemos que os limites do Monumento Natural do Itabira, apesar de se sobreporem em grande parte aos limites do Bem Tombado pelo Conselho Estadual de Cultura, são bem diferentes:

Bem Paisagístico Natural Pico do Itabira e seu Entorno (1km), sobre a Proposta de Inclusão de Zona de Ocupação Controlada (ZOC)
na Zona de Amortecimento do Monumento Natural do Itabira.

No mapa acima podemos observar também que a proposta de ZOC (hachurado vermelho), e com ela o crescimento do Perímetro Urbano do Município adentraria grande parte do lado oeste (esquerdo) da poligonal do Bem Paisagístico Natural Pico do Itabira (linha preta), o que não é permitido.

Já o restante da ZOC (vermelho) encontra-se sobre a Área de Entorno do Bem Paisagístico Natural Pico do Itabira (tracejado preto), que possui um regime de proteção diferenciado do tombamento principal com regras mais brandas.

Porém, a inclusão da Zona de Ocupação Controlada (ZOC) na Zona de Amortecimento do Monumento Natural do Itabira, e sobre os tombamentos efetuados pelo Conselho Estadual de Cultura na região, implica também no crescimento do Perímetro Urbano do Município sobre a Zona Rural do município, sendo que a lei federal do SNUC prevê o seguinte:

Art. 49. A área de uma unidade de conservação do Grupo de Proteção Integral é considerada zona rural, para os efeitos legais.
Parágrafo único. A zona de amortecimento das unidades de conservação de que trata este artigo, uma vez definida formalmente, não pode ser transformada em zona urbana
.” [grifo nosso] (Lei Federal Nº 9985, de 18 de julho de 2000).

Portanto, as conclusões do Parecer Técnico sobre esta questão foram estas:

“(…) apesar da Unidade de Conservação “Monumento Natural do Itabira” ser de âmbito Municipal, mas ser regida também por regras estabelecidas pela Lei Federal Nº 9985, de 18 de julho de 2000, que a enquadra no Grupo de Proteção Integral; e tendo o Município estabelecido formalmente a Zona de Amortecimento do Monumento Natural do Itabira através da Lei Municipal Nº 6954, de 06 de março de 2014, tornando impossível a transformação desta área em Zona Urbana, necessária para a criação da Zona de Ocupação Controlada (ZOC); consideramos desnecessária a análise do pleito quanto as regras de Tombamento do Conselho Estadual de Cultura impostas à área da ZOC proposta, uma vez que o pleito inicial do processo já fere as regras impostas pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), motivo pelo qual somos favoráveis ao indeferimento do pleito de criação de ZOC e crescimento do Perímetro Urbano proposto pelo Conselho do PDM do município de Cachoeiro de Itapemirim na forma que foi projetado, para que não incorra em desrespeito à Lei Federal supracitada.“. (Parecer Técnico CPENP Nº 04/2014 – Conselho Estadual de Cultura).

Desta forma, após este parecer técnico da Câmara de Patrimônio Ecológico, Natural e Paisagístico (CPENP) do Conselho Estadual de Cultura (CEC) ser aprovado no plenário deste, o belo patrimônio cultural-paisagístico do Pico do Itabira e seu entorno pôde ser protegido de mais um ataque em prol da especulação imobiliária. Mas a pergunta que fica no ar é: até quando resistiremos?

Pico do Itabira em Cachoeiro de Itapemirim-ES
(Fonte: https://www.viagensecaminhos.com/2019/12/cachoeiro-de-itapemirim.html)

Esperamos que os dados e estudos divulgados nesta publicação auxiliem os defensores deste paraíso ecológico de Cachoeiro de Itapemirim em sua luta árdua e muitas vezes ingrata na defesa do meio ambiente e do patrimônio cultural brasileiro. Boa sorte, companheiros(as)!

_____________________________

PARECER TÉCNICO COMPLETO:
Aproveitamos para informar aos interessados, que o parecer técnico completo com todos os mapeamentos, dados e análises técnicas (45 páginas) que foi aprovado pelo CEC, pode ser solicitado por qualquer cidadão à SECULT – Secretaria de Estado da Cultura, telefone: (27) 3636-7100, apenas informando que se trata do Parecer Técnico CPENP Nº 04/2014 que negou a autorização solicitada pelo requerente, e se encontra dentro do Processo Nº 65810422 – Autuado em 19/03/2014.

Caso você não necessite do Documento Oficial (com rúbricas, carimbos e assinaturas), mas apenas as informações e análises tecnico-científicas, disponibilizamos o ARQUIVO PDF do Parecer Completo (45 págs) para DOWNLOAD:

Saudações Ambientais!
E hasta la victoria siempre!


Alessandro Chakal

Geógrafo, Músico e Escritor.



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Publicado por Alessandro Chakal

Geógrafo formado pela UFES (Espírito Santo - Brasil); Analista Ambiental e Paisagístico; Analista de Planejamento Territorial e Geoprocessamento (SIG/GIS); foi assessor sênior da Frente Parlamentar Ambientalista do ES (ALES); ex-Conselheiro Estadual de Cultura, na câmara de patrimônio ecológico, natural e paisagístico; Produtor Cultural e Músico (vocalista da banda The Windows - Tributo ao The Doors desde 1994), e responsável pela Agência TURISMO-GEOGRÁFICO: Expedições e Excursões - para o Festival de Jazz & Blues de Rio das Ostras (RJ), e para o Pico da Bandeira e travessia da Cordilheira do Caparaó (ES-MG).

11 comentários em “O Pico do Itabira e a confusão de leis facilitando o Desmatamento e a Especulação Imobiliária

  1. Artigo magnífico! Esclarece as questões em pauta, com detalhes históricos, legais e científicos! Quero parabenizar o autor, Alessandro Chackal, pela grande proficiência que possui em relação às questões ambientais e, também, agradecer por ele ser, há muito, um destacado bastião na luta pela preservação do meio ambiente.

    Curtido por 1 pessoa

    1. Obrigado, querida!
      Deu pra ver que vc sacou a chavinha do problema ali que de repente pode ser resolvido nas próximas ofensivas do capital no Itabira….
      Obrigado pelo apoio e pela força!
      Espero que estes dados (e os mais detalhados e técnicos do relatório) cheguem nos ambientalistas e Promotores (que prestam) lá de Cachoeiro.
      Mas seu feedback já me deixa muito satisfeito.
      Valeu, abraço! Tamos juntos!

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  2. Alessandro Chakal, obrigada, seu artigo está me ajudando em um trabalho jurídico…vou seguir nas redes, quero apreender contigo, Valeu!!!

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